Mafalda Sequeira
Tutora

Entrevista

Mafalda Sequeira, In-House Mentor na Designlab, revela-nos o seu percurso profissional, e como este culminou com o Digital Product Design. 

Todo o nosso conhecimento pode influenciar o nosso papel enquanto designers, mesmo que não diretamente.


Fala-nos sobre o teu percurso académico e profissional.

Estudei em Setúbal até terminar o Ensino Secundário, e depois vim para a Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, onde fiz a minha licenciatura de Design de Comunicação e depois mais tarde o mestrado em Design de Comunicação e Novos Media.

Foi durante o período em que estava a tirar mestrado que comecei a procurar emprego. Sendo a minha formação de base mais focada em design gráfico, foi nessa em que primeiro apostei mas rapidamente me apercebi que o mercado estava saturado: entre estágios não remunerados e salários minímos sem perspetivas de crescimento (salarial e profissional), o cenário não era de todo o mais convidativo. Por contraste, encontrava imensas empresas à procura de web designers que ofereciam melhores condições de trabalho. Resolvi então apostar na área: fechei-me em casa durante cerca de 2 semanas a ver tutoriais e cursos online, e comecei a desenvolver pequenos websites. Tive a sorte de arranjar emprego como web designer com facilidade, tendo começado a trabalhar numa pequena empresa de consultadoria em IT em 2013. Eu era a única designer, numa equipa constituída por 10 developers e 2 pessoas de suporte ao cliente. Foi um desafio enorme mas que me permitiu trabalhar com vários clientes, desde pequenas empresas a instituições de renome internacional. Sendo júnior e sem nenhum designer sénior para me acompanhar, tive de apostar na pesquisa e na experimentação, procurando sempre aprimorar o meu processo de trabalho e a comunicação com a equipa e o cliente final.

Nesta altura estava ainda a desenvolver a minha tese de mestrado, onde me decidi focar no design digital. Estudei a relação entre o Design Visual de websites e a perceção de credibilidade por parte dos utilizadores. Ou seja, quão importante é a aparência visual de uma página para o seu sucesso? Se o utilizador não acreditar numa página, rapidamente irá procurar outra solução entre as centenas que existem online e certamente não irá fazer compras nem realizar qualquer tipo de ações. Este é um assunto que considero extremamente pertinente nos dias que correm, onde somos bombardeados por uma quantidade avassaladora de informação a toda a hora. De vez em quando ainda dou algumas talks sobre o assunto, em conjunto com o meu parceiro de investigação Tiago Machado.

Após o mestrado juntei-me ao Tiago na estruturação e abertura da pós-graduação em Digital Experience Design, na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa. Abrimos o curso em 2015 para colmatar uma falha na oferta do ensino superior, ainda bastante focado no design para print e sem oferta a nível do design digital, contrariamente à tendência do mercado. Estamos agora a terminar a segunda edição do curso, e vamos para a terceira. Todos os nossos alunos têm arranjado bons empregos com uma facilidade notória.

Em 2015 fui trabalhar para a Landing.jobs como Digital Product Designer, onde tive a oportunidade de trabalhar com grandes cabecinhas e pude crescer imenso a nível profissional. Em março de 2017 decidi apostar num novo desafio, trabalhando de forma mais independente e remotamente. Neste momento sou mentora no Designlab, uma escola de design baseada nos Estados Unidos, dou aulas de front-end na Le Wagon e colaboro com mais alguns outros projetos.


Como é o dia a dia de um Digital Product Designer?

Depende muito do projeto que tivermos a fazer… Na Landing.jobs, onde trabalhei com a equipa de Produto, começávamos sempre com a nossa daily scrum meeting, onde cada um falava no que estava a trabalhar e podíamos discutir rapidamente quais a melhores abordagens e como conjugar o trabalho dos diferentes elementos. Depois disso partia para ver algumas notícias — é super importante que nos mantenhamos atualizados na área do design digital — e respondia a emails. A seguir, e dependendo do projeto que tinha em mãos, podia reunir-me com outras equipas, trabalhar em wireframes, mockups, user flows, analisar a concorrência, ver as métricas do produto, implementar a parte de front-end… entre uma infinidade de outras tarefas. Uma coisa que nós cultivávamos imenso e na qual deposito cada vez mais importância, é a noção de que o produto nunca está acabado e que é necessário iterar ciclicamente, consoante o feedback dos utilizadores e métricas de utilização. A Hotjar é a minha ferramenta de eleição neste sentido, permitindo-nos ver como é que os utilizadores interagem com o website e onde é que o design está a falhar.


Que principais desafios se enfrentam na conceção de um produto digital?

Primeiro, que o produto seja único. O mais comum é que já alguém tenha tido a mesma ideia e que ela já esteja implementada, pelo que há-que pensar em como diferenciar o nosso produto de outro semelhante. É necessário pensar bem na proposta de valor, e para quem é o produto. Depois é necessário ter uma visão estratégica e definir um roadmap fazível. Hoje em dia o comum é lançar-se um MVPMinimum Viable Product — primeiro, que nos permita testar a adesão do mercado, e depois ir acrescentando novas funcionalidades ao produto, ciclicamente testando e iterando.

Um dos desafios mais comuns em startups é a dimensão reduzida da equipa e o orçamento disponível. Nos últimos anos tenho trabalhado cada vez menos com software da Adobe, escolhendo alternativas mais baixo custo como o Sketch e Affinity.


O que será tendência nesta área, na tua perspetiva?

Vejo cada vez mais pessoas com variadas formações a entrar na área do design digital, onde neste momento é fácil arranjar um emprego bem remunerado. Encaro isto com bons olhos, porque significa que há cada vez mais gente a valorizar o design e também a enriquecer a área com novas práticas e metodologias. Por outro lado, isto pode querer dizer que em breve o mercado vai começar a ficar saturado e que a procura vai ser menor que a oferta.

A Realidade Virtual e a Aumentada afiguram-se como evoluções interessantes para a área, que permitiriam expandir a experiência do utilizador para fora dos dispositivos que conhecemos hoje em dia, marioritariamente computador, telemóvel e tablet. Estou curiosa para ver se estas tecnologias terão uma adesão significativa, ou se voltarão a ficar perdidas no tempo.


Podes destacar dois produtos digitais onde o design teve um papel preponderante no seu sucesso?

A Airbnb foi fundada por 2 designers, e sempre primaram por uma abordagem focada no design e em proporcionar uma boa experiência de utilização. Os resultados estão à vista, com uma antevisão de 3.5 mil milhões de dólares de lucros em 2020. São também uma referência incontornável a nível de design digital. Apercebo-me que estão constamente a realizar A/B testing e que dão importância a pormenores que parecem irrisórios mas que podem fazer toda a diferença.

O Mailchimp é outro dos meus exemplos preferidos. O Aaron Walter, que neste momento está a trabalhar na Invision e que foi um dos grandes responsáveis pelo estratégia de design do Mailchimp, lançou em 2011 o livro “Designing for Emotion” em que explica a abordagem adotada. É impressionante como conseguiram pegar num produto que não é assim tão interessante e torná-lo entusiasmante para os utilizadores. O tom de voz teve uma grande importância aqui, conjugado com alguns detalhes subtis no design visual.


Que projetos em que tenhas participado foram mais desafiantes?

Entre 2013 e 2015 estive encarregue do rebranding e redesign da Securibox, um produto cloud-based que recolhe automaticamente documentos de vários serviços, desde Amazon, Ebay, EDP, até recibos de vencimento por exemplo. Sendo a única designer a trabalhar no projeto o desafio foi enorme, não ficando atrás da ambição da equipa.

A Landing.jobs foi outro dos projetos mais desafiantes em que participei. Quando entrei em 2015 era a única designer e estava a decorrer o processo de redesign, que na altura foi feito pela Senseslab. Durante os primeiros 6 meses o meu papel foi essencialmente de front-end developer, para implementar o novo design. A partir daí o desafio foi fazer o produto crescer de forma estratégica e consistente, pegando num design visual que não era “meu”. O grande foco foi mesmo compreender as necessidades do utilizador, testar e iterar cicliclamente.


Utilizas alguns sites ou plataformas para te manteres atualizada sobre a área de UX/UI e Digital Product Design?

Recebo várias newsletters às quais dou mais ou menos atenção, entre elas o Product Hunt, Marvel e Invision. Também gosto de acompanhar as publicações do Tobias van Schneider. Confesso que muitas vezes o Facebook se revela a melhor ferramenta neste sentido, tendo em conta que faço parte de vários grupos relacionados com design e tecnologia, e tenho uma boa rede de contactos interessada no assunto e que publica regularmente.


Que mais valias e que dificuldades esperas encontrar, ao lecionar o novo curso intensivo de Digital Product Design & Management da EDIT. Lisboa?

Espero dar uma formação transversal a pessoas de diferentes áreas mas que pretendem apostar no design digital na sua carreira. O meu papel é contribuir para que os alunos adquiram o máximo de conhecimentos possível, que experimentem, e depois ajudá-los a compreender onde se devem focar. Cada um constrói o seu caminho, e ainda bem que não somos todos iguais.


Como pretendes transmitir os teus conhecimentos aos alunos?

Através de exemplos práticos e dando sempre primazia a discussões e à construção de um pensamento crítico, que é algo que valorizo cada vez mais em designers de produto digital.


Podes deixar um conselho para quem pretende entrar no Mercado do Design Digital? Como se pode ou deve diferenciar?

Sejam furões: procurem saber o porquê das coisas, não se ficando apenas pela primeira resposta que vos aparecer; façam do Google o vosso melhor amigo; mantenham-se sempre a par das últimas tecnologias e tendências. Analisem-se a vocês mesmos e tentem perceber no que são melhores e o que gostam mais de fazer: isso ajudará a definir o vosso factor diferenciador! Para pessoas que vêm de outras áreas que não o design, o vosso factor diferenciador pode mesmo ser o vosso percurso e como o encaram. Todo o nosso conhecimento pode influenciar o nosso papel enquanto designers, mesmo que não diretamente.



Partilhar:

    Fale connosco

    Interesses

      Subscrever Newsletter

      Interesses